“Assim como já vo-lo dissemos, agora de novo também vo-lo digo: se alguém vos anunciar outro evangelho além do que já recebestes, seja anátema.” (Gl 1.9).
Lição 2: O falso evangelho
INTRODUÇÃO
Após se apresentar como remetente da Carta aos Gálatas,
identificando-se como apóstolo da parte de Deus, e mencionando que Jesus Cristo
ressuscitou dentre os mortos, Paulo passa diretamente ao assunto que pretende
tratar com os irmãos: a incursão de ideias e práticas judaizantes na comunidade
dos santos, e as consequências dessas ideias na vida dos irmãos.
I. UM APÓSTOLO SURPRESO
1. Paulo se mostra impressionado. O apóstolo Paulo se
declara surpreso com os irmãos gálatas. Os leitores dessa Carta eram pessoas
que já haviam aceitado a Jesus. Já conheciam o Evangelho e já haviam
experimentado o arrependimento e o perdão dos pecados, mas estavam trilhando
uma rota não planejada por Deus. Ele escreve “Maravilho-me de que tão depressa
passásseis daquele que vos chamou à graça de Cristo para outro evangelho” (Gl
1.6). O espanto de Paulo não foi advindo de milagres acontecendo naquelas igrejas,
ou de conversões de pagãos ou mesmo por pessoas estarem sendo cheias do
Espírito. O que deixou Paulo espantado foi não só o fato de os gálatas
atentarem para um Evangelho diferente do que ele havia pregado, mas também pelo
fato de que esse “novo evangelho” incentivava os gálatas a desconsiderarem a
graça e tentarem, por meio de obras, pagar uma dívida que eles jamais
quitariam.
Paulo destaca a expressão “tão depressa” para marcar não só
a inconstância dos gálatas, mas também o pouco tempo que levaram para ser
convencidos de uma outra doutrina. Não deve nos espantar que entre o povo de
Deus haja pessoas que sejam atraídas por novos ensinos, e que com facilidade se
deixem levar por doutrinas que nada tem de respaldo nas Escrituras. A pouca
firmeza no que tinham aprendido e a incapacidade de julgarem uma doutrina como
errada nos serve de exemplo para que nos firmemos no exercício da verdade.
2. Da graça para a lei. A surpresa de Paulo se dá por causa
da mudança que os gálatas fizeram, de passarem da graça de Deus para a Lei de
Moisés. Como isso se deu? Eles receberam um ensino em que, para que pudessem
realmente ser salvos, deveriam ser circuncidados e seguir a lei dada aos
hebreus por Deus. Bastou o apóstolo se afastar do convívio daqueles irmãos que
logo eles deram crédito a outra pregação diferente da que haviam recebido
originalmente.
Como veremos, Paulo deixa implícito que a lei e a graça, em
que pese serem expressões que remontem a história de Israel e o plano da
Salvação, possuem atribuições diferentes.
3. Outro Evangelho. A palavra “outro”, na língua portuguesa,
é um pronome indefinido utilizado de forma ampla, para designar algo ou alguma
coisa que seja da mesma natureza, que seja semelhante, ou que seja de outra
natureza. Para definir o exato significado, precisaremos saber o contexto em
que essa palavra está sendo usada. Na língua grega, a palavra “outro” tem duas
percepções distintas, advindas igualmente de duas palavras apontadas: allós,
que significa “outro da mesma espécie”, e heteros, “outro de outra espécie”.
Enquanto na primeira designação a opção apresentada é a de um objeto ou ser da
mesma espécie, com possíveis variações, tais como um tigre e um leão, que mesmo
sendo animais diferentes entre si, são felinos. Por sua vez, a palavra heteros,
“outro” de outra espécie, tais como um cão e um gato. São seres criados, mas
diferentes entre si por serem de espécies diferentes. Por isso Paulo comenta:
“[...] para outro evangelho, o qual não é outro” (Gl 1.6,7).
É possível que hoje sintamos a mesma surpresa com que o
apóstolo se deparou ao saber da notícia da mudança daqueles irmãos. Mas mesmo
em nossos dias, é possível ver irmãos na fé sendo convencidos por doutrinas que
não foram ensinadas com a correta interpretação dos textos bíblicos, dando
ouvidos a instruções que buscam acrescentar à Palavra o que ela não diz. Os
gálatas tinham sido evangelizados e ensinados por Paulo, e não perceberam que a
mensagem dos judaizantes era um falso evangelho. Eles não negaram, oficialmente,
o sacrifício de Jesus, mas acrescentaram argumentos que acharam guarida no
pensamento daquelas igrejas. Era uma mensagem aparentemente piedosa, mas que
negava a eficácia do Evangelho. Por meio desse ensino, a graça de Deus estava
sendo questionada.
“Falsos professores
tinham vindo à Galácia para tentar persuadir os gálatas a rejeitar o
ensinamento de Paulo e aceitar ‘outro evangelho.’ A sua mensagem ensinava que a
salvação espiritual e um relacionamento correto com Deus envolviam não apenas a
fé em Cristo, mas também a integração com a fé dos judeus, por meio da
circuncisão (5.2; veja Rm 2.29, nota: Fp 3.2), da obediência à lei (3.5) e da
observância aos dias santos dos judeus (4.10). (1) A Bíblia afirma claramente
que há uma única mensagem verdadeira de salvação espiritual ‘o evangelho de
Cristo’ (v.7).
Ele nos vem pela ‘revelação de Jesus Cristo’
(v.12) e pela inspiração do Espírito Santo. Este evangelho (as ‘boas-novas’ é a
verdadeira mensagem a respeito de Jesus) é definido e revelado na Bíblia, a
Palavra escrita de Deus. (2) Quaisquer ensinamentos, crenças ou ideias que se
originem de pessoas, igrejas ou tradições e não estejam expressos ou implícitos
da Palavra de Deus não fazem parte da verdadeira mensagem e não podem ser
incluídos no evangelho de Cristo (v.11). Mesclar essas noções e filosofias criadas
pelo homem com a mensagem original de Jesus é ‘transtornar o evangelho de
Cristo’ (v.7).” (Bíblia de Estudo
Pentecostal para Jovens. Rio de Janeiro: CPAD, 2023,
p.1624).
II. O ANÁTEMA
1. A inquietação dos gálatas. Um falso ensino tem a
capacidade de deixar as pessoas alvoroçadas e inquietas. Paulo usa as palavras
“vos inquietam e querem transtornar” (v.7) como um indicativo de que, enquanto
seus leitores liam a Carta, provavelmente havia judaizantes entre eles. Um
outro detalhe é que a mensagem deles deixava os gálatas inquietos, em vez de
descansarem na graça de Deus, eles passaram a realizar obras da Lei, sendo eles
mesmos, gentios. Uma mensagem que alvoroça os crentes deve ser analisada com
bastante cautela.
2. Ainda que um anjo do céu. Os anjos são conhecidos na
Palavra de Deus como mensageiros do Eterno para tratar de assuntos referentes
aos seres humanos. Eles apareceram, no Antigo Testamento, a Abraão, a Josué, a
Gideão, aos pais de Sansão e a Isaías.
No Novo Testamento, apareceram à Maria, ao pai de João
Batista, a Pedro e a Cornélio entre outros. A presença deles geralmente, nas
Escrituras, é acompanhada de uma mensagem. Paulo mesmo recebeu a visita de um
anjo quando estava indo a Roma em um navio que estava afundando (At 27.23).
Cornélio recebeu a visita de um anjo, cuja mensagem foi: “As tuas orações e as
tuas esmolas têm subido para memória diante de Deus” (At 10.4). “Procure por
Pedro” (At 10.5). O anjo não falou de Jesus ou do Evangelho a Cornélio, mas lhe
orientou a respeito de quem deveria chamar para ouvir as Boas-Novas.
Paulo deixa expresso que mesmo que um anjo, identificando-se
como sendo enviado por Deus, venha apresentar uma mensagem diferente da sua,
que seja considerado maldito. O apóstolo não teme usar esse adjetivo, pois sabe
que a pureza do Evangelho está em jogo naquelas igrejas.
3. Anátema. A palavra “anátema” é oriunda do hebraico herem,
e pode ter dois sentidos: algo devotado a uma divindade, e ao mesmo tempo
excluído da utilização humana, como o relatado em Josué 6.17, quando os
despojos de Jericó deveriam ser separados para Deus, não podendo ser usados
pelos israelitas, ordem que não foi seguido por Acã. Esse anátema foi tão sério
que Acã e sua família pagaram o preço da ganância com a vida. Mas o segundo
sentido é mais radical, pois representa anathematizo, colocar debaixo de uma
maldição. Mesmo que um anjo viesse até eles e lhes ensinasse um outro
Evangelho, que fosse maldito e condenado.
III. AGRADAR AOS HOMENS OU A DEUS
1. Repetindo a advertência. Como o assunto é muito sério,
Paulo repete a observação. Não poderia haver dúvidas sobre a força das palavras
paulinas, pois o assunto era grave. O apóstolo menciona uma segunda vez essa
mesma condenação no versículo 9. A repetição desses dizeres nos mostra o quão
sério é deturpar os ensinos da Palavra de Deus. O “evangelho” dos judaizantes
estava afastando os irmãos do verdadeiro e os encaminhando para uma vida de
legalismo, onde o homem acredita que pode ajudar Deus na salvação ou pode ele
mesmo ser o seu Salvador.
2. O que agrada aos homens. Paulo não se preocupa em falar
palavras lisonjeiras para deixar seus leitores confortáveis diante do que
estavam fazendo. Ele não estava tratando a respeito de boas práticas ou de um
discurso protocolar, cabível em certas ocasiões mais formais. Ele estava
tratando a respeito da salvação da alma dos gálatas. Os judaizantes bajulavam
os gentios, e com palavras doces os desviavam dos caminhos do Senhor. As
palavras de Paulo poderiam soar como amargas, mas era o remédio que os gálatas
deveriam tomar.
3. O que agrada a Deus. Como veremos, a preocupação de Paulo
é agradar ao Senhor, por isso escreve a Carta aos Gálatas. Se fosse para
agradar aos homens, ele poderia deixar a situação nas igrejas da Galácia correr
sem qualquer interferência. O tempo certamente iria mudar o cenário, ou
pioraria a situação. Mas ele entendeu que deveria ter uma participação ativa no
resgate dos gálatas. Paulo nem estava na Galácia, e poderia deixar o problema
de lado, mas resolveu tratar o assunto a fim de que os irmãos não se perdessem.
A obediência ao verdadeiro Evangelho agrada a Deus.
Preservar as doutrinas bíblicas, de Deus, que recebemos, estudar e estar
atentos para discernir quando um falso ensino tenta entrar na congregação,
também agrada a Deus. Viver pela fé e não pelas nossas próprias obras, também
agrada a Deus.
Algo que deve ser observado é que a deturpação dos falsos
mestres, e por sua vez, o que desagradava a Deus, é que, na prática, os gálatas
queriam “devolver” a Deus o favor, o presente que Ele lhes dera. Ele lhes
entregara a Salvação pela graça, e eles queriam retribuir o favor divino por
meio de uma vida que se baseava em obras humanas.
CONCLUSÃO
Nesta segunda lição, vimos que Paulo começa a apontar aos
seus leitores o caminho que eles estavam trilhando: um caminho paralelo ao
caminho do Evangelho. Eles estavam ouvindo uma mensagem doutrinária errada e
não tiveram discernimento. Eram ensinos que estavam em desacordo com o que
haviam aprendido. Paulo os exorta que ainda que um ser angelical viesse do céu
com uma mensagem parecida, eles não deveriam aceitar. Precisamos ter cuidado
com ventos de doutrina que se aproximam de nossas congregações, tentando
afastar os irmãos da verdadeira prática da Palavra de Deus.
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