INTRODUÇÃO
Vamos começar a apologética cristológica no
presente trimestre com o tema “A Encarnação de Jesus”, uma doutrina sobre a
humanidade de Cristo. O mesmo apóstolo João que se empenha em mostrar a deidade
absoluta de Jesus se preocupa também em enfatizar que Jesus viveu entre nós,
participou da natureza humana e teve corpo físico humano. A presente lição é
uma apologia à sua humanidade plena.
I. HERESIAS QUE NEGAM A
CORPOREIDADE DE CRISTO
1. O que é Docetismo? O termo vem do grego dokeo, que significa “ter aparência”.
O Docetismo é a mais antiga heresia da história da igreja e consiste em negar
que Jesus tivesse tido corpo físico humano, sua humanidade era simplesmente uma
aparência, como um fantasma.
2. O que os docetas ensinavam
sobre Jesus? Os seguidores dessa heresia ensinavam muitas coisas fora das
Escrituras e contrárias à Palavra de Deus. O nosso enfoque destaca a humanidade
de Jesus, como o verdadeiro homem. Lucas descreve um começo muito humano. Jesus
teve parentes e amigos, Zacarias e Isabel (Lc 1.5), José e Maria (Lc 2.4,5),
vizinhos e primos (Lc 1.36,58), pastores (Lc 2.8), Simeão, Ana (Lc 2.25,37).
Isso sem contar o relato sagrado de sua infância, que enfoca o seu
desenvolvimento físico, intelectual e espiritual (Lc 2.40,52).
3. O que os principais docetas
diziam sobre Jesus? Três dos principais heresiarcas negavam que Jesus Cristo tivesse
vindo em carne. Cerinto negava o nascimento virginal de Jesus Cristo e ensinava
o Docetismo. Ele foi contemporâneo do apóstolo João em Éfeso. Saturnino, o
principal representante do Gnosticismo sírio, ensinava que Jesus Cristo não
nasceu, não teve forma e nem corpo, foi simplesmente visto de forma humana em
mera aparência. Marcião é outro heresiarca que negava ser Cristo
verdadeiramente humano, mas quanto ao seu corpo, não se sabe se na opinião dele
era apenas uma aparência ou de substância etérea. No entanto, a Bíblia declara
de maneira direta que Jesus nasceu, mencionando até mesmo local, em Belém da
Judeia (Mt 2.1; Lc 2.11), e época, no reinado de César Augusto, imperador
romano (Lc 2.1). A Bíblia fala também do corpo físico de Jesus (Jo 2.21).
II. A AFIRMAÇÃO
APOSTÓLICA DA CORPOREIDADE DE JESUS
1. “O que era desde o
princípio” (Jo 1.1). Os Evangelhos de Mateus, Marcos e Lucas,
denominados de Evangelhos Sinóticos, apresentam Jesus, ressaltando seus
aspectos humanos, ao passo que João reforça o aspecto divino. Os três
Evangelhos expõem Jesus exteriormente, ao passo que João o revela
interiormente. Pode-se dizer que o Evangelho de João é uma interpretação de
Jesus. A expressão “O que era desde o princípio” é uma reiteração daquilo que o
apóstolo afirma na introdução do Evangelho que leva o seu nome: “No princípio
era o Verbo” (Jo 1.1), isso significa que o Verbo já existia mesmo antes da
criação (Gn 1.1). Mas João nunca perde de vista que “o Verbo se fez carne”. Não
se contenta apenas com isso, mas apresenta detalhes importantes, é que o Verbo
não somente se fez carne, para não deixar dúvida alguma, “e habitou entre nós”,
mas também foi visto pelas pessoas (Jo 1.14).
2. A reafirmação
apostólica (v.1b). O apóstolo reitera o que afirma na introdução do
seu Evangelho: “O que vimos com os nossos olhos, o que temos contemplado, e as
nossas mãos tocaram da Palavra da vida”. Isso pode parecer até uma redundância,
“vimos com os nossos olhos”, mas o propósito é mostrar com muita ênfase, sem
deixar dúvida alguma, que o Senhor Jesus veio em carne ao mundo, e que pôde ser
tocado pelos que com Ele conviveram (Jo 20.27). Veja que a presença do nome de
Pilatos no Credo dos Apóstolos o posiciona nos acontecimentos passados. Ele
“sofreu sob Pôncio Pilatos”, ou seja, padeceu nas mãos de um personagem da
história, logo, o Senhor Jesus só pode também ser alguém da história (Rm 1.3).
3. Uma crença
herética (1Jo 4.2,3). João viveu seus últimos dias na cidade de Éfeso,
que era a cidade de Cerinto, o doceta. Os escritos do apóstolo João, o
Evangelho, as três Epístolas e o Livro de Apocalipse, foram produzidos na
última década do primeiro século. Nessa época, o docetismo já se difundia entre
os cristãos. Por isso, o apóstolo esclarece, e de maneira direta, que todo
aquele que nega que Jesus veio em carne não é de Deus (1Jo 4.3). Veja a
gravidade dessa heresia, pois se Jesus não teve corpo físico real, Ele também
não morreu, e se não morreu, também não ressuscitou, se não ressuscitou, logo
não há esperança de salvação (1Co 15.1-3,17,18). Por essa razão, o apóstolo
João foi contundente contra os docetas. Os expoentes de tal crença são chamados
de “enganadores” (2Jo 7).
A UNIÃO HIPOSTÁTICA
“A união hipostática descreve a
união entre as naturezas humana e divina na Pessoa única de Jesus. Entender
adequadamente esta doutrina depende da completa compreensão de cada uma das
naturezas e de como se constituem na única Pessoa. O ensino bíblico acerca da
humanidade de Jesus revela-nos que, na encarnação, Ele tornou-se plenamente
humano em todas as áreas da vida, menos na prática de um eventual pecado.
Uma das maneiras de nos
convencermos da completa humanidade de Jesus é esta: os mesmos termos que
descrevem aspectos diferentes da humanidade também descrevem o próprio Jesus.
Por exemplo, o Novo Testamento frequentemente usa a palavra grega pneuma (espírito) para descrever
o espírito do homem; e a mesma palavra é empregada para Jesus. Ele mesmo
aplicou a si o pneuma, quando, na cruz, entregou o
seu espírito ao Pai e expirou (Lc 23.46).” (HORTON, Stanley M. Teologia
Sistemática: Uma perspectiva pentecostal. Rio de Janeiro: CPAD,
1995, pp.324,325).
III. COMO ESSAS HERESIAS SE
REVELAM HOJE
1. Quanto ao nascimento virginal
de Jesus. Há movimentos que negam o nascimento virginal de Jesus, como os
mórmons, a Igreja da Unificação, e ensinam que Ele não foi gerado pelo Espírito
Santo. Negar a concepção e o nascimento virginal de Jesus é uma das marcas
desses movimentos. É o ensino moderno de Cerinto e seus seguidores. A Bíblia
anuncia de antemão a concepção e nascimento virginal de Jesus desde o Antigo
Testamento (Is 7.14) e seu cumprimento histórico no Novo Testamento. Jesus foi
gerado pelo Espírito Santo (Mt 1.18,20); o anjo Gabriel disse a Maria: “Descerá
sobre ti o Espírito Santo, e a virtude do Altíssimo te cobrirá com a sua
sombra” (Lc 1.35).
2. Quanto à morte e à
ressurreição de Cristo. O heresiarca gnóstico do Egito, Basilides, negava a crucificação
de Cristo, dizia que Simão, o cirineu, transfigurou-se e foi equivocadamente
crucificado, e que o populacho o tomou por Jesus. Assim sendo, Cristo apenas
presenciou a crucificação de Simão, seu suposto sósia. O Alcorão, o livro
sagrado dos muçulmanos e sua principal fonte de autoridade espiritual, declara
que o Senhor Jesus não foi crucificado, que tudo não passou de uma simulação
(Alcorão 4.157). Nas notas explicativas de rodapé nas edições do Alcorão, eles
afirmam que um sósia de Jesus foi levado à cruz. Isso se parece com a ideia de
Basilides. Essa doutrina contraria todo o pensamento bíblico e os fatos
históricos. A Bíblia ensina que Jesus morreu e ressuscitou dentre os mortos
(1Co 15.3,4).
3. Confirmação histórica. A confirmação bíblica e
histórica da morte de Jesus é fato incontestável. Historiadores não cristãos,
judeus e romanos, atestaram a morte de Jesus. Flávio Josefo, historiador judeu
(37& #8212; 100 d.C.), disse: “acusaram-no perante Pilatos, e este ordenou
que o crucificassem. Os que o haviam amado durante a sua vida não o abandonaram
depois da morte”. O historiador romano Tácito (55 — 117 d.C.) escreveu: “Aquele
de quem levavam o nome, Cristo, foi executado no reinado de Tibério pelo
procurador Pôncio Pilatos”. A Bíblia declara que Jesus “depois de ter padecido,
se apresentou vivo, com muitas e infalíveis provas” (At 1.3).
A TEOLOGIA LIBERAL E A BÍBLIA
“Em palavras simples, a doutrina
cristã ortodoxa da Bíblia postula que ela é sobrenaturalmente inspirada por
Deus e infalível e normativa em todas as questões que dizem respeito à salvação
— de modo geral, definida como o relacionamento de uma pessoa com Deus e o seu
cumprimento a nível pessoal. Ela é singular dentre os livros por ser a Palavra
escrita de Deus, diferente em espécie, não somente em grau, de outros livros
importantes. Essa crença no status especial da Bíblia é encontrada na própria
Bíblia (e.g., 2Tm 3.16, 17; 2Pe 1.20,21) e ao longo da História da Igreja,
desde os Pais Eclesiásticos até o pensamento ocidental da era moderna, quando
os deístas, por exemplo, começaram a questionar a inspiração e a autoridade da
Bíblia. Comparado ao consenso cristão ortodoxo de que a Bíblia é a revelação
que nos foi sobrenaturalmente dada por Deus, o Cristianismo liberal trata a
Bíblia como um livro humano de grande percepção e sabedoria espiritual, mas que
não é divinamente inspirado, nem singularmente normativo. [...] Os cristãos
liberais são, no entanto, extremamente relutantes em falar sobre a autoridade
da Bíblia, e isso os deixa sem uma fonte ou norma objetiva para as crenças e as
doutrinas cristãs.” (OLSON, Roger. Contra a Teologia Liberal: Uma
defesa cristã bíblica tradicional. Rio de Janeiro: CPAD, 2023, pp.54,55).
CONCLUSÃO
As expressões “o Verbo se fez
carne” e “Jesus Cristo veio em carne” significam uma resposta aos docetas. Os
Evangelhos revelam vários atributos característicos do Jesus ser humano. Ele
foi revestido do corpo físico porque o pecado entrou no mundo por um homem, e
pela justiça de Deus tinha de ser vencido por um ser humano. Jesus se encarnou.
Fez-se homem sujeito ao pecado, embora nunca houvesse pecado, e venceu o pecado
como homem.
Nenhum comentário:
Postar um comentário